sexta-feira, janeiro 23, 2004

Carta aberta ao governador

Querido Governador Joaquim Roriz:

A intenção desta missiva é mantê-lo informado sobre o que acontece aqui em Brasília durante a sua ausência. Não votei no senhor, mas como respeito o processo democrático, sinto-me na obrigação de deixá-lo ciente dos fatos, uma vez que os seus assessores, no afã de preservar o seu lado emocional tão sensível, escondem a realidade. Inclusive, testemunhei a sua surpresa ao tomar conhecimento de algumas atitudes erradas perpetradas por seus companheiros políticos. Uma pessoa tão crédula como o senhor, que confia nos amigos até a última instância, não pode deixar de se assombrar com o mal-feito dos outros.

Sem mais delongas, vamos aos fatos:

- uma parte do teto do Hospital de Base desabou. É, caiu. Talvez pelas chuvas abundantes que têm despencado por aqui, talvez pela idade do prédio (um representante do hospital esteve na televisão alegando que o prédio tem 44 anos!!!!!Talvez fosse o caso de formar uma comitiva para ir a São Paulo, ou ao Rio de Janeiro, ou a Minas Gerais, para aprender como se constroem prédios que durem mais de cem, duzentos anos). Tenho uma teoria ainda mais interessante: o que fez o teto do hospital desabar foi o intenso trânsito de doentes provenientes de outras cidades, que entopem o sistema de saúde do DF. Essas pessoas não sabem que, aqui em Brasília, não buzinamos, não fazemos barulho em demasia, ou seja, somos perfeitos cavalheiros e damas. Talvez o teto do citado hospital, chocado com tantas pessoas de hábitos diferentes dos nossos, tenha desistido de dar cobertura a tamanho despropósito. Outra teoria: os doentes de câncer, principalmente os que estão em estado terminal, devem ter escondido os remédios no teto, é claro que orientados por algum petista rancoroso (sempre eles!), para parecer que está havendo falta de medicamentos (logo no seu governo...hahaha). Com o peso, o pobre teto não resistiu e caiu. O importante, governador, é que o problema já está sendo resolvido. As pessoas que tinham consultas marcadas no HB foram mandadas para outros centros de saúde. Alguns mais longe da Rodoviária, é claro, mas já está provado que uma boa caminhada faz maravilhas para a saúde. E do que mais eles estão precisando além de saúde??

Algumas pessoas, instruídas, é óbvio, por petistas insatisfeitos, insinuam que o senhor não se importa com a saúde do DF. Que absurdo, senhor governador!! E o stress que o senhor aliviou nos moradores do Lago Sul com a construção da terceira ponte? Imagina a fortuna que eles iriam gastar em analistas por ficarem presos nos intermináveis engarrafamentos de Brasília...pobrezinhos...

- e esse povo que continua a invadir área pública? Quem mandou? Quem chamou? Aposto que foi algum petista com dor-de-cotovelo, só para depois jogar a culpa no senhor. Como disse brilhantemente a nossa vice-governadora, a culpa das invasões, na verdade, é de JK, que trouxe aquele tanto de gente para trabalhar aqui nos anos 50. Nem tinha tanto trabalho assim, para que aquele tanto de gente? Teve também aquele moço que disse “Crescei e multiplicai-vos”. Olha só, que incitação à reprodução sem planejamento, à invasão de terras, pois é claro que eles vão precisar de espaço para alojar o produto dessa multiplicação. Acho que JK e esse moço eram, na verdade, petistas enrustidos, que queriam jogar o povo, desde aquela época, contra o senhor (como eles sabiam do seu futuro governo? Não tenho certeza, mas acho que Dom Bosco sonhou com o senhor...).

Do que essas pessoas reclamam, pelamordedeus? Brasília sempre foi uma cidade diferente, de vanguarda. Não é coerente que ela seja diferente em outras coisas também? Por exemplo, cobrar IPTU em terrenos irregulares. Quer coisa mais lógica? E permitir que uma fave...desculpe, que uma invasão fique por mais de quinze anos sobre uma área de preservação ambiental, jogando lixo em nascentes, poluindo tudo? Quer coisa mais pitoresca e acolhedora? Não é à toa que Brasília é uma das capitais mais visitadas do país em datas festivas...

Não permita, governador, que as minhas notícias atrapalhem o seu passe...quero dizer, o seu trabalho aí na Europa. Aliás, mais uma vez o senhor está defendendo com unhas e dentes e musse para cabelos os interesses da sociedade. Um trem-bala daqui para Goiânia. O que poderíamos desejar mais do que isso? Escolas, projetos sociais, crianças comendo lixo, doentes morrendo por falta de remédio, desemprego, violência? Coisas pequenas. Nunca vi uma escola ganhando prêmio de arquitetura que nem a terceira ponte ganhou. Uma beleza...

Curta bastante o ar europeu, volte bem descansado para assumir novamente o seu cargo de “pai dos pobres”. Brasília o espera de braços abertos, querido governador...

P.S: Ah, estou mandando também uns quarenta beijos. Um para cada integrante da sua modesta comitiva. Espero que estejam gostando dos hotéis cinco estrelas que nós, contribuintes, estamos patrocinando para alguns deles. Afinal, alguém precisa se divertir, não é mesmo?

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