Quem tem preconceitos? Basicamente, todos nós. Mas, se formos pegar uma amostra, é mais fácil achar preconceitos em classes mais favorecidas. Sim, classes menos favorecidas também têm preconceitos. E é isso que a minha historinha de hoje vai ilustrar. Senta aí, que eu conto tudinho.
Eu sou usuária do transporte coletivo aqui em BSB. E quem assiste a noticiários ou lê jornais não precisa morar aqui para saber que pagamos caro (no meu caso, R$1,60) para andar em ônibus em estado de conservação no mínimo lastimável. Saio dos coletivos me sentindo um martini, do tanto que chacoalho. Só faltava o cobrador me dar uma cerejinha...
Hoje, às 11h da manhã, peguei um ônibus que me surpreendeu. Novinho, limpinho, cheirosinho. Fiquei bem feliz por ver que as coisas, pelo menos naquela linha, estavam começando a melhorar. Só que a minha alegria durou bem menos do que eu esperava.
Quando fui passar pela roleta, o motorista deu uma freada. Eu desequilibrei e segurei na primeira coisa que consegui (uia, sem pensamentos maldosos, please!): na roleta. Com o puxão que eu dei, a roleta travou. Aí é que começou o "pobrema". O cobrador começou a gritar comigo. "Olha aí, a senhora quebrou a roleta!". Eu pedi calma a ele e perguntei o que poderia fazer para resolver. Enquanto isso, o ônibus parou e outras pessoas começaram a entrar. Só que a roleta estava travada. Aos berros, o cobrador me mandou descer, subir pela porta traseira e passar pela roleta. Bom, como eu percebi que o moço estava alterado, fiz tudo para não piorar a situação. Foi bom, porque eu vi que o meu PD está funcionando: passei por um espaço de, no máximo, 20cm. Mas o moço não ficou satisfeito: gritando, mandou que eu ficasse sentada nos bancos da frente. Eu disse que não iria ficar ali, pois era lugar exclusivo para idosos ou deficientes. Ele gritou mais ainda e eu resolvi sentar.
Mas, como a vida é mais larga que comprida, tinha esse outro moço, que assistiu a tudo. Quando ele foi passar pela roleta, o cobrador deu uma travada com o pé e machucou o outro moço. E o show recomeçou, agora com novas personagens. Resumindo a ópera: o moço era policial, fomos todos para a delegacia. Eu, quietinha, boquinha de siri. Quando tudo parecia resolvido, eis que o cobrador recomeça a soltar seus petardos:
"Por isso que eu não gosto de usuários. Tudo um monte de filhos da puta. Prefiro trabalhar na Estrutural, com o pessoal mais humilde, porque esses ricos... aliás, metidos a ricos, porque se fossem ricos, estavam andando de carro, e não de ônibus. Aquela ali (e apontou para mim) eu fui ajudar (!!!) e ainda ficou contra mim. Tudo um monte de FDP..."
Eu pedi para que ele parasse de falar, mas ele continuou. Todos os outros passageiros pediram para ele parar de falar, mas ele continuou. Eu levantei, peguei minha agendinha, uma caneta, copiei o número do ônibus, a placa... bom, vou fazer uma reclamação formal, conversar com meus advogamigos, ver o que posso fazer... primeiro, vou procurar o policial. Um mocinho me passou um papel com o nome e o telefone. E disse que, se eu precisasse de testemunha, bastava procurá-lo.
O mais importante para mim vem agora: todos no ônibus começaram a contar casos semelhantes, casos que até mesmo envolveram machucados, por causa de quedas. E disseram que não valia a pena brigar. Que ninguém escuta pobre. Aquilo doeu no meu estômago.
Numa coisa o cobrador estava certo: eu não sou rica... mas também não sou metida a rica. Ando de ônibus por medida de economia e praticidade. O policial usou muitos clichês do tipo "Você não sabe com quem está falando". Mas ele sabia sim. Ele estava falando com pessoas, gente, que nem ele. Imagino (vejam bem, só imagino) que eu tenha um nível social, cultural, financeiro melhor que o do cobrador. Isso é um pré-conceito. Mas não me sinto superior a ele senão na educação e no trato com as pessoas.
Custa muito tratar as pessoas como nós gostaríamos de ser tratados?
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