quarta-feira, fevereiro 02, 2005

A Paixão segundo FG

Noite. Sentada na minha cama, entregava-me à minha nova paixão: fazia filtros para aprisionar maus sonhos. Sobre o armário, o calendário do advento que fiz para as minhas duas paixões, Céci e Laila. De repente, um som de plástico sendo amassado. E ela surgiu. Uma barata. Cascuda. Voadora...

Eu devia parar de ver televisão. Outro dia vi que, se você encontra uma barata, existem outras cinco à espreita. O que me fez pensar não naquela barata recém-aparecida, mas sim nas cinco que, escondidas e covardes, jogaram a companheira como "boi-de-piranha" diante das minhas vistas.

Se elas soubessem que não precisava... se elas soubessem do meu pavor ancestral a baratas. Nesses momentos, descubro habilidades insuspeitas. Se houvesse, nas Olimpíadas, competição de pulo assustado, com certeza eu seria campeã.

Deixo o quarto sob o domínio da cucaracha. Tenho um plano em mente: matá-la afogada, atingida por uma tsunami de inseticida. Mas Deus protege a bichinha. Será que eu sou a malvada? Sim, porque os cientistas dizem que elas resistem até à bomba atômica... e eu derreto até com beijo na boca bem dado... não achei o fliter... merda... vassoura? Não, contra os meus princípios...

Aliados, é claro! E toca acordar a minha mãe, que dormia a sono solto àquela hora. Mas eis que a safada (a barata, não a minha mãe!) pressente o que virá. E se esconde! Ainda me faz passar por mentirosa!

Às vezes é preciso recuar... sofá-cama do quarto da minha irmã, que, solidária e também apavorada com esses bichinhos, apenas solta um som indefinido quando eu justifico a minha presença: "Barata".

A luz de um novo dia muda todo o cenário. Acordo com a Cida me perguntando sobre a barata. Narro todos os acontecimentos da noite anterior, faço um mapa do campo de batalha. Cida, impávida e varonil (pelo menos mais do que eu), busca em cada canto, sacode as cortinas, encontra até o brinco que eu perdi no ano passado... e nada... nem a visível, nem as cinco invisíveis... foram embora, as calhordas!

Minha mãe, então, aproxima-se. Entre os dedos, uma antena conhecida. Ali, enrolada no papel higiênico, reconheço a minha opositora da noite anterior. Era ela. Rendemos as últimas homenagens e jogamos seu corpo no vaso sanitário... é doce morrer no mar... sei que ela gostaria.

Não me senti feliz. Mas agora só penso em uma coisa: onde estão as outras cinco???

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